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Mostrando postagens de julho, 2013

Humanos fedem

Apertei o pneu e empurrei com força. Cheguei até o criado mudo. Abri a gaveta. Estava lá. Reluzia. Saquei o tambor, seis balas. Rolei-o com um toque de dedo e, num golpe curto devolvi-o para o seu lugar. Estalou seco! Gosto de ouvir o som do encaixe. É como uma espécie de ritual. Algo que me dá prazer. Usei a outra mão e voltei para perto da janela. Vi meu reflexo nele. Estava limpo. Um matador como eu, metódico, aprecia a morte desde o seu início. Entende? Coloquei a arma junto de mio core, como prefiro. Um Raging Bull, cano dez polegadas merece esse cuidado. O 45 foi uma encomenda das mais apropriadas, para a minha arte. É assim que vejo a morte, como arte. Já na rua, o breu da escuridão apanhava as calçadas sombreadas pelas árvores em meio ao canteiro central da avenida. Aproveitei o terreno e deslizei pelo passeio. Escutava o soar das rodas ao tempo que me aproximava do lugar. Lucrei as mãos e acendi o careta. A fumaça ia embora e eu sentia o gosto que só o filtro vermelho pod

Olhos azuis

“Não pretendo estabelecer relação alguma entre causa e efeito — entre o desastre e a atrocidade por mim cometida. Mas estou descrevendo uma série de fatos, e não desejo omitir nenhum dos elos dessa cadeia de acontecimentos”, Edgar Allan Poe. “Uma noite, fiz a beleza sentar em meu colo. E achei amarga. Injuriei. Me preveni contra a justiça. Fugi. Ó bruxas, ó miséria, ó ódio, a vós meu tesouro foi entregue! [...] Ah! pequei demais: — Mas, caro Satã, por favor, um cenho menos carregado! e esperando algumas pequenas covardias em atraso, como aprecia no escritor a falta de faculdades descritivas e instrutivas, lhe destaco estas assustadoras páginas do meu bloco de condenado eterno”, Arthur Rimbaud. Eu o via sempre durante essas quermesses em favor da igreja. Ele era um menino magro e alto, com um nariz enorme e vermelho. A sua pele alva e seus cabelos negros como a ponta das suas unhas sujas de terra, me passavam um ar bucólico e inocente. O que mais gostava nele era o seu jeito de fal

Agonia na cadeira de balanço

_1 O casarão é mórbido e enorme. Fica perto de minha casa. Sempre que tenho de passar em frente, atravesso a rua. É um lugar medonho de dia e de noite. Antigamente, sede de uma fazenda, que com o tempo, fora engolida pela cidade. Um lugar pesado e cheio de agonia. _2 “Veja, meu amor, Francisco de Goya é o maior pintor que conheço”, comentava George, empolgado, ao tempo em que contemplava “Saturno Devorando Seus Filhos”. Ela não disse nada, mas sorriu, olhando-o com seus olhos azuis. Helena esticou seu braço, oferecendo sua mão ao marido, que atendeu a sua iniciativa e apanhou-a, ao tempo em que seguiram para a varanda, onde George, gentil, a acomodou na cadeira de balanço. George trabalhava como restaurador de obras de arte, e achava que a mudança para a fazenda, herança recebida de seu pai, era oportuna, tendo em vista que, pensava em aumentar a família e tinha a chance de viver bem, sem problemas financeiros cuidando do gado e aproveitando um dos cômodos da majestosa casa como

Diário de um interno no manicômio Jean Cloude Barnett

“Só que ele estava com um humor infernal, porque tomou aquela pílula, entendem? Não sei que tipo de pílula era aquela. Uma pílula vermelha”, Stephen King. _1 “Estava sentado em minha cama. É sempre assim, eu tenho esse canal aberto com outros mundos, outras dimensões. Entende? Foi do nada, abriu um abismo no chão, cheio de dentes, que me engoliu e me atirou numa estrada fantasmagórica”. _2 Estava perdido. Os calos e as bolhas em meus pés tornavam-se quase insuportáveis, andava fazia dias. Acho que era por isso que a minha mochila estava mais pesada que o normal. Enquanto tragava o cigarro, soltava a fumaça e sentia uma espécie de papa na boca, por causa da secura do ar e da textura do monóxido de carbono que os carros lançavam ao passarem por mim, me ignorando completamente, pareciam até que fugiam de alguma coisa ou alguém. “O vale da morte”, dizia a placa pela qual cruzei. Olhava em minha volta e via a vegetação rude acompanhada de um clima de desesperança, um lugar cheio

Eu também te amo

Eu me sentia mais fedido que o normal, o calor me entediava e eu não aguentava mais aqueles lençóis emporcalhados de porra grudando em mim. — Hei Rose, vamos até o bar do Danado? — Eu não vou. Minha cabeça está doendo. Parece que fui atropelada por uma manada de elefantes. Acordei me sentindo mais destruída que o Burroughs. — Claro, bebeu todo o meu uísque ontem à noite. E olhando bem pra você, vejo que seus olhos são loucos como a junk. — Seu idiota. Além de dormir fora e encher a cara no meio das rameiras, ainda acha que tem o direito de me amolar. — Mas que marmota é essa? Nunca se importou com esse tipo de coisa. Isso é ciúme? — Sai dessa, eu não sou careta. Você sabe disso. E pare de agir como se tudo que existe nessa espelunca fosse seu. Não sou obrigada a te agradar o tempo todo. Já fodemos hoje de manhã. Isso basta. — Mulheres, em pouco tempo querem mudar tudo que amaram um dia. O que houve? — Não foi nada, mas é que estou cansada das suas baboseiras. — Mas o