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Mostrando postagens de setembro, 2014

Tudo o que ele quer é estar em paz

Ele anda e para diante da fonte, sorve um gole, senta, olha firme o horizonte. Ele pensa, rumina, nada diz. O vento é forte, a tempestade está próxima, há uma barra, uma faixa escura a vir de encontro dele, mesmo assim, ele não se move. Os primeiros trovões soam, os iniciais pingos são volumosos e tocam a sua face, nenhum deles escorre, pois um a um penetram em sua carne e encharcam a sua vingança, a sua alma, a sua dor. Os transeuntes o olham e não creem, alguns fazem o sinal da cruz, e outros tantos resmungam: “Deus, ele está seco, mesmo embaixo de chuva ele está seco”. Calado, ele se levanta, e errante se move em direção do horizonte, porque tudo o que ele quer é estar em paz, afinal de contas, ele está seco, cansado de simplesmente, matar.

São 9 andares

“Mas o que você está fazendo aqui?”, perguntou. “Ora, bebendo uma cerveja”, falei. “Mas por que aqui em cima?”, insistiu comigo. “É que a minha TV está um lixo e a minha mulher quer assistir, então eu vim até aqui dar uma olhada na antena”, falei. “Certo”, respondeu, “mas você não vai me impedir, vai?”, finalizou. “Impedir, como assim, impedir de quê?”, perguntei. “Bem, eu decidi que vou me suicidar e acabar com toda esta porra de vida”, respondeu. “Entendo, mas me diga, você acha mesmo que vale a pena, pense na sujeira que vai fazer lá embaixo, na calçada da rua, imagine a confusão, são 9 andares, projete a imagem de um gari com uma vassoura e uma pá na mão recolhendo o que sobrou de todo o seu corpo e das suas frustrações e odiando a experiência, o seu nome ficará marcado como o de um simples suicida, eu acho que não vale a pena, vá pra casa, abra uma cerveja e depois de bebê-la, durma, quando acordar, tudo ficará bem, o que acha?”, falei. “Certo, você tem razão, eu

Pois então eu fiquei louco

Sim, como se não bastasse todas as notícias, como se não bastasse todos os impostos, como se não bastasse todos os incoerentes, como se não bastasse todos os empecilhos, ainda isto, foi o que pensei, logo que vi o desastre, então emendei: porra, a merda da máquina fotográfica se foi, esta foi a minha reação, afinal de contas, era preciso carregar a bateria da maldita máquina fotográfica a cada foto, ou seja, eu escrevia em minha máquina de escrever, fotografava e postava em minha página na rede social Facebook, mas agora, isto se transformou em algo inviável, pensei: o que faço agora, se o público gosta de cartões?! Então apelei pra tecnologia com um humor de cão raivoso e baixei um programa pra diagramação e fiquei contente, eu escrevia no Word, passava o texto pro Corel Draw, punha a fonte de máquina de escrever e postava na rede social Facebook, só que como se não bastasse tudo isto, agora me aparece um aviso dizendo que a opção

Novidades

Todo dia tem uma nova, um botão, uma cor, uma caixinha com uma surpresa, todo dia sai um cortezinho novo no texto, e o que era ontem já não é mais hoje, a todo instante, uma novidade o condiciona, e tudo é muito simples, ou você usa o que tem, ou então conversa com o banqueiro.

Está chovendo e as caixas estão quase todas vazias, ainda bem

Normalmente, levo a minha vida sem horários definidos, sem regras, sem nada, só que nos últimos tempos, isto mudou, mas é por uma boa causa. Eu reviso, eu edito, eu faço oficinas literárias dentro e fora da internet, nas escolas e nas universidades, eu mantenho grupos de estudos literários e textuais, e eu também escrevo feito um louco, é o único modo que encontrei pra seguir, eu sou um polvo, um mutante, sabia? Seja segunda, terça, quarta ou quinta, lá estou eu, isto já tem quase um mês que neste horário, 5h, percorro as estações de ônibus, os cafés, as padarias, as ruas, os botecos onde os trabalhadores ganham peso, e nestas horas eu sou uma mosca matutina, sabia? Porém, na sexta, no sábado e no domingo, eu me torno um ser noturno, uma espécie de morcego a rodar os postos de gasolina, os botecos, as esquinas, as pizzarias, é assim que eu vivo, entregando de mão em mão, um livro pra um, um folhetim pra

A gente nunca se compreendeu

Quando eu lia um outdoor eu pensava em que eles estavam fazendo, em que eles acreditavam e nunca os compreendia. Sempre que eu ligava a televisão e prestava atenção naquela merda toda eu pensava em que eles estavam armando, em que eles acreditavam e nunca cheguei a compreender nada. Via as vitrines nas livrarias e eu pensava em que eles estavam lendo, em que eles queriam fazer e nunca conseguia compreender o que eles pretendiam. A gente nunca deu certo, a gente nunca fez a mesma coisa ou mesmo pensou parecido, e por isto tudo a gente nunca se compreendeu. Vivi tempos enfadonhos a beber e pensar, a escrever e guardar, a falar sobre muitas coisas em horas, lugares e em momentos errados, eu queria saber, eu queria falar, eu queria correlacionar uma coisa com a outra e nunca rolou. Então eu me mudei pra um calabouço fortificado, eu me servi uma dose de gim e deixei a garrafa ao meu lado, eu liguei um disco e o botão do foda-se, eu me libertei em mim m

O mundo não precisa de mais do mesmo

Eu tenho uma teoria, e talvez você ache que é loucura da minha parte, mas eu já me acostumei com rótulos, sabotagens e gente estúpida, é isto mesmo, o tempo é como uma vacina, uma espécie de casca ao redor da nossa pele, como uma blindagem; você me entende? É verdade, porque depois de um tempo, você para de se importar com os cães que latem dentro do pátio, e compreende que apenas os cães que estão na rua podem brigar contigo; você me entende? Porque latir não é morder, e a minha teoria é muito simples, o mundo não precisa de mais do mesmo, acredite em mim. Ninguém aguenta mais a mesmice, e eu posso provar isto que penso através da minha experiência de vida. E vou explorar uma situação corriqueira pra que eu seja o mais claro possível em minhas colocações e você me entenda; certo? Experimente foder a sua garota sempre do mesmo modo, seja sempre o mesmo carinha de estilo feijão com arroz pra ver se mais cedo ou mais tarde, ela não dará um

Faro de urso-polar

Sentei-me à mesa do canto e fiquei quieto, perto de onde fritavam as batatas e serviam as doses, ali eu me mantive por horas seguidas a anotar, a encher um cinzeiro, a maltratar o meu fígado e a minha mente, eu não queria conversa. A janela entreaberta sugava pra dentro um pouco dos cheiros que havia lá fora e ao mesmo tempo mandava lá pra fora um pouco dos cheiros que havia lá dentro, uma troca incessante. Não sei dizer se esta troca é uma disputa ou não, mas entendo que a mesma seja necessária pra que as pessoas continuem farejando o mundo, e mesmo que você não tenha um faro de urso-polar eu confio que todos sejam capazes de usá-lo nas mais diferentes formas e dentro dos mais distintos níveis. Acho que o modo e o nível de percepção com os quais farejamos dizem respeito ao padrão de vida que cada um escolheu pra si mesmo, não acha? E embora eu não tenha a certeza do que a multidão pensa eu tenho ideia do que eu sinto quando farejo tudo isto e as minhas percepções não são lá mui

Eu tomei uma atitude

Porra, eu não aguentava mais, era muita merda de uma vez só, o tempo inteiro, eu recebia todo o tipo de coisa, e pra falar a verdade, nada do que enviavam a minha pessoa me interessava. Por que não me mandavam ofertas de cerveja, por que não me mandavam ofertas de livros, por que não me mandavam ofertas de papel-ofício, por que não me mandavam ofertas de rolos de fita pra minha máquina de escrever, por que não me mandavam ofertas de discos pra minha vitrola, por que não me mandavam ofertas de bons filmes em super 8, por que não me mandavam ofertas de rodas pro meu carro (eu tenho um Galaxie 78), por quê; por quê; por quê? Porque os miseráveis me acham fora de moda e atrasado. Por que não me mandavam uma boa notícia dizendo que todos os pássaros estavam livres das suas gaiolas, por que não me mandavam uma boa notícia dizendo que os homens estavam todos voltando pras escolas pra aprenderem o que é o certo, por que não me mandavam uma boa notícia d

A vitrola chegou hoje

Está novinha, belíssima como sempre foi. Eu me senti tão bem com a chegada dela que até dei uma gorjeta ao rapaz que a trouxe. E a olhar toda a sua singeleza eu percebi como ela se basta por ela mesma, e isto me emocionou. Então, antes mesmo de enxugar as minhas lágrimas, escolhi o que iria ouvir. Decidi que o mais adequado para o momento era o grande Itzhak Perlman, um violinista e maestro que me arrebata. E ao ouvir as primeiras notas de sua música, eu tive a ideia de que a vitrola é o meu próprio coração a bombear o sangue que me dá vida por entre as minhas veias. Sim, hoje é um dia especial, o qual guardarei e imortalizarei para sempre nesta folha de papel. E quando a tristeza bater em minha alma eu procurarei por entre as minhas fichas a localização deste escrito e o lerei por centenas de vezes até que eu possa me sentir melhor,

Eu só ficaria bem se estivesse dentro de você

A remexer em tudo que sente enquanto busco ouvir um sussurro que venha da sua alma, algo honesto, lá do meio das suas entranhas. Quero invadir tudo que é seu até onde puder pra descobrir como você é, você me entende? Porque é impossível ganhar um amor que valha a pena sem alcançar seu útero, sem conhecer tudo que alguém pode compartilhar, este é o único modo de preencher todo o vazio que há e ouvir um sussurro que venha da sua alma, algo honesto, lá do meio das suas entranhas.